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As Boas Maneiras – Review: Mês do Halloween

As Boas Maneiras – Review: Mês do Halloween

A monstruosidade que carregamos

O terror que conhecemos por muito tempo se baseou em figuras do folclore. De histórias que foram contadas não uma, mas várias vezes, passadas de gerações e ganhando diferentes camadas conforme iam sendo recontadas! E os contos envolvendo lobisomens também forma alvo disso. No interior do Brasil é comum encontrar pessoas mais velhas que certamente irão relatar o encontro com tal figura assustadora ou como alguém conhecido enfrentou a besta metade homem, metade lobo e conseguiu sobreviver de sua monstruosidade.

Dito isso, As Boas Maneiras, filme de Juliana Rojas e Marco Dura, disponível no Telecine Play, a aborda a construção e a uma nova visão do “monstro” licantropo, aproximando o espectador de uma fábula que revela diferentes traços de uma sociedade, do comportamento humano e das escolhas que são feitas quando o amor materno se torna uma arma para proteção. Sim, temos aqui um exemplar que vai muito além do terror costumeiro!

Fale mais sobre Isso

Ana é um jovem grávida que está há pouco tempo na capital paulista e na procura por uma babá encontra em Clara a ajuda que tanto almeja. Porém, logo a contratada irá perceber que a gravidez de sua “chefe” não é tão comum assim, trazendo então uma série de situações, e o desenvolvimento de uma relação, onde o inimaginável assumirá uma forma que apenas nos mais fantasiosos contos poderia ser encontrada.

O clássico sob um novo olhar

É perceptível que os diretores Juliana Rojas e Marco Dura tomaram para o seu projeto diversas referências à clássicos do terror que tem o lobisomen como personagem central ou antagonista. Contudo essa não é apenas uma história sobre uma criatura fantástica e o medo que causa nas pessoas. Na verdade está longe de ser algo nesse sentido!

A direção nos entrega dois blocos de filmes diferentes, pautados na mesma narrativa, para demonstrar o quanto as tais boas maneiras do título vão sendo deixadas de lado, seja por laços que são criados, seja por escolhas mortais realizadas. Para isso, o design de produção e a fotografia criam ambientações sufocantes e ao mesmo tempo espaçosas para confrontar os sentimentos de seus personagens em tela. Ao mesmo tempo, mesclam uma atmosfera melancólica com uma tensão e apreensão crescente que se torna cada vez mais palpável à medida que as protagonista fortalecem o vínculo e se aproxima o estágio final da gravidez.

Da mesma forma, o comando do longa emprega com precisão efeitos práticos e digitais, criando cenas que irão nos fazer até mesmo virar o rosto, como no momento do parto de Ana. E assim estabelecer um traço do cinema de horror importante para a continuidade deste tipo de jornada em tela.

Tudo isso ganha ainda mais força por conta da dupla de protagonistas! Isabél Zuaa começa sendo uma incógnita em tela, mas aos poucos vai deixando seus sentimentos, frustrações e anseios saltarem em tela nos levando consigo no decorrer de seus momentos. Já Marjorie Estiano, passeia por entre os medos, as incertezas, impulsividade, num turbilhão de sensações potencializadas pela gravidez de sua personagem. Ambas são um retrato de uma sociedade, de suas exclusões, de suas normas e regras impostas em relação a mulher, sua conduta, sua maneira de viver. E aqui, o elemento fantástico transforma cada um desses aspectos!

Pegando o fantástico para falar do que é real

Desde o início da trama percebemos que não estamos em uma história convencional de lobisomens! Toda a construção misteriosa ao poucos entrega os elementos que fazem parte dessas narrativas, até mesmo ampliando diferentes pontos, o que torna o filme ainda mais original em sua proposta, pois o interessante não é apenas se apegar a um terror por si só, mas fazer o espectador questionar certas nuances que sutilmente surgem em tela.

O papel da mulher na sociedade, o julgamento pré-estabelecido pelos outros quando se deparam com uma mãe solo, o olhar de desconfiança quando é apresentada uma empregada negra sem referências, a religião que tenta assumir o controle em determinado momento, cada uma dessas camadas aparecem de maneira explícita ou se escondem nas entrelinhas.

Ao mesmo tempo quando adentramos os elementos fantasiosos a trama nos dá sequências que nos levam do surreal ao medo pelo o que pode acontecer às personagens, pois diante de toda essa construção nos apegamos às suas vidas com a vontade de que tudo aquilo tenha um desfecho satisfatório. Entretanto, a texto da obra nos relembra, neste ponto, que estamos numa história de terror!

Vai me Assustar?

As Boas Maneiras não é um filme para causar espanto ou fazer você saltar da cadeira, é um terror que beira o psicológico, o indigesto, o incômodo, trazendo numa realidade as condições de estranheza de uma criatura tão conhecida da cultura pop! Tais elementos se misturam às demonstrações de como a sociedade observa tais figuras e como estas precisam lidar com o desconhecido, dentro e fora de si!

A direção então emprega elementos clássicos para contar uma narrativa mais próxima do que conhecemos e nos remetendo sempre que a produção é uma fantasia, mas além disso, uma alegoria sobre muitos e muitas, sobre suas circunstâncias da vida, sobre medos, desejos e descobertas que crescem, em compasso à lua cheia!

Logo, quando o primeiro uivo é escutado, entendemos que todos nós carregamos monstruosidades, todos nós possuímos momentos de transformação, só que para alguns tudo isso permanece acorrentado, já outros, libertam a fera de qualquer forma não pensando nas consequências. E nessa relação de quem é o verdadeiro monstro, refletimos, tememos e assim como os protagonistas, vamos de encontro àqueles que são tão assustadores quanto o próprio ser metade homem, metade lobo!

Título: As Boas Maneiras • Direção: Juliana Rojas e Marco Dura • Elenco: Isabél Zuaa, Marjorie Estiano, Miguel Lobo, Cida Moreira, Andréa Marquee, Felipe Kenji,  Nina Medeiros • Ano: 2018 • Onde assistir? Telecine Play

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